Monday, June 18, 2018

Não posso deixá-la morrer


    Não posso deixá-la morrer, esse não pode ser o destino da minha filha, ela é apenas uma criança. Eu prometi a ela que não deixaria o pior acontecer. 

    Tudo começou tão derrete, estávamos de férias na praia quando Ana começou a sentir falta de ar, seu corpo foi ficando cada vez mais fraco, foi quando percebi que poderia ser algo grave. 

    Chegando ao hospital ela foi logo atendida, mas comecei a me preocupar ainda mais quando vi o médico pedindo uma tomografia, aquilo só podia significar uma coisa. 

    O médico diagnosticou Ana com câncer no pulmão em estágio avançado, a única coisa que poderia salva-la seria um transplante de pulmão. 

    Naquele momento nossas férias haviam acabado, pois com a notícia voltamos para São Paulo para tratar Ana. Minha esposa era médica cirurgiã  e sabia melhor do que eu lidar com a doença de nossa filha. 

    – Vamos ter que esperar na fila de transplante até encontrarmos um doador compatível. Agora só nos resta ter fé. – Disse ela tentando parecer calma. 

    – Isto pode levar uma eternidade, não podemos esperar tanto tempo, é a vida de nossa filha que está em risco! – Eu disse impaciente, tentando encontrar alguma solução. 

    Não podemos fazer nada, apenas esperar e rezar. – Ela insistiu para que eu mantivesse a calma. 

    – Eu vou morrer pai? – Ana me perguntou chorando. 

    – Não vou deixar isto acontecer. Eu prometo! – Respondi a ela, vendo aquela cena que me cortava o coração, uma menina tão doce que sonhava em ser médica como a mãe agora vai ter que lutar para viver. 

    Com o passar dos dias e semanas logo completou o primeiro mês de espera, o estado de Ana não estava nada bem, mas estávamos fazendo todo o tratamento de acordo com a ordem do médico. 

    Foi quando completaram dois meses que meu desespero começou, Ana piorou muito na semana passada e o médico disse que o tempo dela estava se esgotando, talvez este fosse o fim dela. 

    – Se sua filha não receber um novo pulmão ela ainda tem cerca de quinze dias de vida. – Disse o médico. 

    – Não tem nada que possamos fazer? – Perguntei tentando ter alguma esperança de que Ana ficaria bem. 

    – O câncer já se espalhou por todo o pulmão, inclusive eu recomendo que ela seja hospitalizada em estado de observação, visto que ela pode piorar a qualquer momento. – Respondeu o médico, acabando com qualquer esperança que ainda nos restava. 

    – Eu vou ficar bem, papai me prometeu! – Disse ela sorrindo para o médico e abraçando seu coelho de pelúcia favorito. 

    A coisa mais triste que já vivenciei foi ver uma criança tão nova como minha filha nesse estado, apenas 8 anos e o médico dizendo que ela estava com os dias contados, mas ainda sim ela mantinha a esperança no que eu a prometi. 

    – Sim filha, pode contar comigo. Não importa o que o médico diga, você vai viver custe o que custar. – Eu disse a Ana pegando em sua mão e saindo do consultório ignorando completamente a recomendação do doutor. 

    Foi quando a maior loucura de minha vida passou em minha cabeça, vou matar alguém e pegar seu pulmão, minha esposa tem acesso ao banco de dados do hospital e vai descobrir alguém com um pulmão compatível com a nossa filha. 

    Isso era uma completa loucura, ela encontrou um garoto saudável que era exatamente o que estávamos procurando. O jovem Miguel de 12 anos não imaginava o que lhe esperava. 

    Ele estava voltando da escola sozinho, de acordo com seus registros ele não morava longe, mas ainda sim ofereci uma carona, muito relutante o garoto acaba aceitando entrar no carro quando eu disse que era amigo de seus pais e que sabia onde ele morava.

    Assim que entrou no carro peguei o pano com clorofórmio e fiz ele desmaiar, quando Miguel recobrou a consciência ele estava amarrado em uma maca pronto para a cirurgia.

    – Tudo pronto para começarmos? – Perguntei a minha esposa que estava muito nervosa com a situação. 

    – Acho que sim, mas temos um problema, temos apenas anestesia que consegui pegar no hospital para nossa filha, Miguel vai ter que estar acordado enquanto você retira seu pulmão. – Disse ela se sentindo um monstro pelo que ela estava fazendo. 

    – Não se sinta assim. Logo teremos nossa filha de volta. Você sabe que esta é a única chance que ela tem de sobreviver. – Eu disse a ela. 

    – Mas não é justo tirarmos a vida de outra pessoa para salvar nossa filha. – Disse ela ainda relutante para fazer a cirurgia. 

    – Também não é justo que a nossa pequena Ana tenha câncer. EU NÃO POSSO DEIXÁ-LA MORRER!!! – Eu disse quase a ponto de surtar com a situação. 

    Ela anestesiou nossa filha para que não olhasse enquanto eu assassinava Miguel. Eu peguei a faca da nossa cozinha e abri cuidadosamente o peito de Miguel, que se debatia e gritava em desespero vendo seu pulmão ser arrancado diante de seus olhos. 

    Antes que a cirurgia terminasse a polícia arromba a porta da frente, guiada pelo rastreador no celular de Miguel. Vendo a situação do corpo mutilado dele e a faca ensanguentada em minhas mãos a polícia não hesitou em atirar. Mas antes que eu deixasse este mundo pude dizer minhas últimas palavras. 

    – Não posso deixá-la morrer!                                      

    O caso foi encerrado como um crime macabro feito por pais desesperados para salvar a vida de sua filha, entretanto ambos morreram  baleados durante a invasão da polícia, enquanto a menina sobreviveu com o novo pulmão. 

    No fim consegui cumprir minha promessa, eu a salvei, mesmo que isto custasse a minha vida e a de minha esposa. Talvez isto jamais precisaria ter acontecido se mais pessoas fossem doadoras de órgãos. Não culpe apenas os pais desesperados da pequena Ana. 


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